domingo, 17 de maio de 2009

Topgun.

No segundo-grau, nos tempos de Emílio Zuñeda, tive um colega impagável, o James. Lembro dele vestindo jaqueta preta de couro, óculos rayban estilo aviador e calças jeans coladas ao corpo. Encarnava o personagem de Tom Cruise, o Maverick, do filme Top Gun. Caminhava como ele, parava como ele e até o sorriso meio abusado ele imitava. Mas seus planos iam além; ele jurava que ia passar entre os primeiros na prova da EPCAR e em poucos anos seria piloto de caça, obviamente, não pilotando os F15 da Marinha Americana, mas as sucatas Xavantes da FAB que viviam se enrodilhando em redes de alta-tensão e matando seus tripulantes. De qualquer forma seria um top gun.
Em pouco tempo, James virou a galhofa da turma, mas ele nem ligava. Era filho único de militar e de uma professora e estava em dia com sua auto-estima. Sendo do PV, tinha uma legião de fãs entre as meninas do curso técnico de contabilidade e a cada semana ele aparecia com uma diferente. Na educação física, diziam sempre que sua namorada era a boqueteira da gurizada do time de basquete e ele, por vias das dúvidas, trocava logo por outra, igualmente feia. Mas o que James desejava era impressionar a Terezinha que, além de ser a mais bonita da sala, era primeira-prenda e dançava na invernada do Farroupilha.
Nas avaliações do bimestre ele foi a surpresa; se ralou como a maioria, mas logo se recuperou. Diferentemente do Fábio Gamino, que só comia choquito pelos corredores e mesmo assim fazia com um pé nas costas as provas da Ana Olinda, James dependia de seu esforço para ter boas notas.
Mas o segredo da quarta-série só eu e o Dutra conhecíamos. Não éramos colegas, mas estávamos no mesmo pelotão para desfilar no 7 de setembro. James, de calça branca e jaleco dourado de porta-bandeira, emborcou litros de iogurte para aliviar o calor na concentração e não convidava ninguém.
Entramos marchando na Praça. Palpitava agitado o coração brasileiro à palavra Pátria. Eu e o Dutra íamos logo atrás de James, quando ouvi um “chuac, chuac” compassado, seguido de um choro baixinho. Ele estava todo cagado, uma mancha amarela percorria toda a perna direita até os sapatos que transbordavam a caganeira. Rebelaram-se a províncias internas de James, por culpa do iogurte. Em segundos todo o pelotão estava às gargalhadas, seguido pela multidão da praça. Os pais de James não riam, naturalmente, mas sua mãe guardou a máquina Yaschica na bolsa. James cruzou frente ao palanque, onde todos riam sem se agüentar, ainda mais cagado, chorando como um bebê e conduzindo o lindo pendão verde-amarelo.
Ao que se sabe e do que se pode presumir da convivência com ele nos anos seguintes, James não alimentou nenhum trauma relacionado àquele desfile de sete de setembro. O desejo de ser top gun não rolou, mas James copiou seu pai e hoje é sargento do Exército Brasileiro.

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