Ninguém entende a fixação megalomaníaca e obsessiva que Melinda nutre por ninhos de coelhos da Páscoa. Todos os cômodos da mansão, a pérgula e o jardim estão tomados de ovos já na sexta da Paixão, espalhados pela criadagem e por homens contratados especialmente para a empreitada. Atrás de cada arbusto e árvore, lá estão os ninhos do orelhudo, bem farto de chocolates Godiva, suíços, é claro, com mais cacau, mais amargos e livres de gorduras trans.
Mas tudo tem uma simples explicação, uma história e todos entenderão. Melinda teve uma infância pobre, muito pobre. Todos os seus amigos de infância acordavam cedo nos domingos frios de Páscoa para caçar o ninho repleto de guloseimas. Seus primos apareciam com as bochechas lambuzadas de marrom e nenhum naco sequer de um triste ovo de chocolate para dividir com a prima pobre. Todos se empanturravam até terem convulsões e Melinda não podia saborear nem um simples alfajor “El Aguila” com gosto de sabão “chibeado” de Paso de los Libres. Mas ela acreditava no coelho amigo e todas as manhãs de Páscoa, prestigiava o ritual – em vão, é bem verdade. Caía da cama de sobressalto e, ainda de pantufas, corria para os esconderijos prováveis revelados nos sonhos recentes da noite do sábado de Aleluia. Nunca encontrou o tal ninho e por anos perdurou a sua busca, sempre assistida pelo pai desempregado, sentado no umbral da porta em silêncio. Uma cena lamentável. De causar dó a mais estóica das almas.
Na realidade a semana Santa sempre representava dias difíceis para Melinda. Na sexta, quando todos comiam peixes assados, fritos, ensopados, recheados, ela comia sardinha em lata com arroz branco e o que era pior, tinha que abrir mão do leite no café da manhã e ir à missa. Seu pai, católico praticante, jejuava de verdade: só pão e água. No final da tarde, às vezes, algum vizinho aparecia com algumas sobras de traíra frita; aqueles mais espinhentos próximos da cauda, já frios e murchos, o que já era uma alegria. Chocolates, porém, ninhos de coelho, ninguém tinha essa idéia.
Enfim, num domingo de Páscoa quente, daqueles no mês de Março, Melinda levantou da cama cedo, disposta a empreender mais uma busca sabidamente inútil, mas desistiu, de súbito, desestimulada pela imagem do pai sentado à porta. Naquele dia, porém, logo no dia em que ela desistiu da caça ao ninho, em que resolveu admitir que já não mais acreditava no Coelho da Páscoa, o ninho estava lá, resultado de um bico bem pago que seu pai tinha feito dias atrás. Como não fez a caça ao ninho, o pai de Melinda frustrado, obrigou-se a revelar o esconderijo, onde estavam os ovos de chocolate, àquela altura, já derretidos pelo calor outonal. Esse dia marcou Melinda com a força de um trauma e quando finalmente rompeu a barreira da pobreza ela passou a comprar e espalhar por todos os lados o maior número possível de ninhos e eles são tantos que ficam lá, alguns esquecidos, por anos e anos, esperando que Melinda os encontre.