Sim, luvas brancas de um tecido que lembrava cetim. Ele nunca vira uma mulher vestir luvas de cetim, a não ser nas cerimônias de casamento. Ela retirou-as com delicadeza, revelando mãos tão finas e alvas, e as depositou no interior da bolsa Channel. Agora, estava sentada a sua frente, a uma mesa de café de distância, sorvendo um chá com madeleines, as quais exalavam seu odor de essência de flor de laranjeira pelo recinto. Sabia que era francesa, mas esquecera seu nome. Procurou no programa, mas nenhum lhe pareceu familiar. Outra pessoa, então, perguntou e ela respondeu, "Eléne Truffaut". Será parente do diretor de cinema?, ele pensou, quase ao mesmo tempo em que a pessoa que antes perguntara o nome, para o qual ela tinha a resposta na ponta da língua: "não, não sou parente do cineasta" - e em bom português, completou - "É um sobrenome muito comum na França, o Truffaut, como Silva no Brasil".
Martine, a discípula de Barthes que figurava como a presença mais importante do congresso, aproximou-se e falou alguma coisa no ouvido de Eléne e saiu. Eléne mal se mexeu e ele sentiu um agradável sentimento de proximidade por aquela estrangeira atraente, cabelos negros, contrastando com a alvura da pele. Sentia que poderia abordá-la sem receio, trocar algumas palavras e logo, estaria com o braço em torno daquela cinturinha, ou no mínimo, sentado a sua frente, à mesma mesa, quando poderia convidá-la para tomar uma bebida.
Faltavam as palavras, no entanto. Precisava articular um plano de aproximação, escolher cada palavra do discurso de apresentação. Pensava na literatura francesa, mas conhecia pouco além de alguma novela de André Gide. Se falasse sobre Foucault, se embaralharia. Sobre cinema, o melhor expediente, o parentesco com Truffaut, já tinha sido desperdiçado por uma criatura efeminada que certamente nutria apenas interesses acadêmicos por Eléne.
Esperou que algo lhe ocorresse e enquanto esperava por esta luz, observava o nevoeiro que se formava no final da tarde no parque serpenteado por Plátanos. Distraído, não percebeu que Eléne já o observava nem tampouco que ela se aproximara e estava em pé ao seu lado.
- Vou me sentar – disse Eléne, já puxando a cadeira.
Em minutos ficaram à vontade; ele, impertinente, retirou as luvas brancas das mãozinhas francesas; ela pagou o vinho caro, chileno; ele soube que ela lecionava na Alemanha; que orientava alunos franceses do doutorado na Universidade de Leipzig. Ele, um simples estudante de Comunicação Social, não tinha motivos para resistir ao convite para tomar a última garrafa de vinho na suíte da moça.
Assim que atravessaram a porta do quarto de hotel, Eléne começou a livrar-se das roupas. Ele abriu o vinho, providenciou as taças e antes de servir-se foi até o banheiro tirar a água do joelho.
Agitava-se de excitação. Encontrou-a já quase sem roupa, sentada na borda da cama, distraída enquanto coçava cuidadosamente o calcanhar. A cada roçada de unha um tipo de pó acinzentado soltava da pele de Eléne, acumulando-se em torno do pé direito, formando um acúmulo do que pareciam raspas de queijo Roquefort. Ele se aproximou para ver com mais detalhe. E era isso mesmo, restos de pele, células mortas acumuladas provavelmente pela ausência de banhos regulares. Mas o que sobressaía era o perfume de Eléne e ao ver os seios nus da francesa, levemente caídos, mas com os bicos bastante empinados, não teve dúvidas que teria uma inesquecível noite de prazer.
Ao final, só teve uma certeza: tudo o que falam sobre os franceses é a mais pura verdade.