domingo, 11 de outubro de 2015

A felicidade não acena



Começo citando 2 frases do francês Pascal Bruckner e uma de  Jacques Prévert, mas essa, a 3ª, também citada pelo primeiro:

1.  "No mundo ocidental, quem não é feliz se sente excluído e fracassado", 
2. "A felicidade é extremamente individual e efêmera por definição. Por isso, as pessoas obcecadas em conquistá-la, como a uma propriedade, sofrem em dobro e se distanciam das pequenas alegrias da vida."
... e a melhor a qual cito sempre que me parece apropriado: 
3.  "Reconheço a felicidade pelo barulho que ela faz ao partir".
Se não tivesse ouvido da boca de um amigo esta 3ª frase, a qual toca fundo, logo na primeira vez que se ouve, eu, provavelmente, jamais chegaria até este filósofo francês, jamais saberia da existência dele, mesmo que no Google se encontre milhares de referências sobre o pensador.
Especialmente, esta sentença, é esquisita.  A gente  a entende, pois ela nos arrebata, mas na verdade, a compreendemos sem entender por que ela nos opera este sentimento. É rica em lirismo, apesar de atuar inicialmente como aquelas mensagens subliminares, por mais absurdo que pareça; ela passa e, a gente, num instante a pega e ela se aloja lá dentro, bem fundo, sem que se consiga ao menos ler a placa do caminhão que nos arrebatou.
E sabem por quê? Ela, de alguma forma, consegue em poucas letras, responder à velha questão de natureza ontológica, não “o que é felicidade?”, mas “como é a felicidade?” que, de outra forma, se não responde, dá pistas sobre a resposta da primeira. A felicidade, sim, é uma questão de consciência,  mas nesta frase de 6 ou 7 palavras percebe-se muito claramente que a felicidade age de tal forma peculiar e sutil que a gente nem a vê, não a reconhece; reconhecemos sim a infelicidade, a dor, que aparece quando esse tão almejado estar feliz, transmutou-se no seu oposto, ou seja, a felicidade só se anuncia, quando dá adeus e nada dele se pode recolher se não uma ligeira fagulha, pequena insuficiente para o regozijo, mas plena para plantar a esperança de que ela se reapresente, presto.
Por isso que eu tenho pensado sobre isso, cada vez mais, sobre a importância de se ter, se não muitos, bons amigos, pois  não fosse pelo meu amigo Gilmar Marcílio   - outro filósofo da vida simples e seus prazeres coloquiais; dos tempos felizes - não teria chegado a esta frase, que parece suscitar uma compreensão daquilo que o  ocidente canta como um libelo improvável ou fortuito e que o pensamento não ousa buscar entender sem já anunciar a refutação tenaz logo ali à frente, sem saber que a ciência não é o instrumento capaz de  perscrutar a felicidade, talvez e tão-somente, é capaz de fazê-lo com a alegria, esse elétron da última camada do átomo desta, que se confunde com o sentido da vida e da qual já falamos. 
Frases não conseguem mudar a vida de ninguém, mas conseguem impor uma inquietação que se expande numa corrente de outras inquietações. Comigo, por vezes, é assim.
Quando eu era guri, possivelmente, há mais de vinte anos, acreditava que este país era muito limitado para os meus projetos, que era preciso ir para o estrangeiro; agora já reconheço o que é o estrangeiro, não é preciso ir para lado nenhum. Talvez, dar um pulo em Nova York nos dias que antecedem o Natal e só. Depois, no fim da vida, me recolher mais ao Oeste, sobre esta linha identificada como paralelo 30' S, que dizem ser muito boa para cultivar uvas finas que produzem bons vinhos.
Parece resignação, mas é só efeito da redescoberta de tralhas tão caras como a riqueza que é ter amigos, estes seres que tal qual a felicidade partem, mas, ainda que sem data marcada, retornam.
Penso sobre o que Schopenhauer diria disso? Arrisco afirmar: vai continuar sendo assim, mesmo sabido, ela vai continuar a se anunciar, somente e simplesmente pelo barulho que faz ao, sorrateiramente,  partir. Ela parte, faz barulho sim, mas não acena.

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