Por fim, depois de muito retorcer os pensamentos, percebi que não me queriam por perto. Mas sei que cada opinião vacilava sobre minha permanência ou partida ao sabor da luz dos dias e da direção do vento, mas ao final, na soma dos dias, era isto que queriam, me ver a sesmarias distante. Fui-me.
Ao voltar pude ver a casa absolutamente só, quieta, apesar do dia luminoso que fazia mais desbotado o verdinho das paredes.
O cão não correu ao meu encontro, não pulou, não me lambeu nem ao menos abanou o rabo. Entrei e o silêncio empertigado manteve-se sonoramente.
Olhei pela janela, aquela luminosidade que ofusca os seus próprios raios, já não exultava em seu intento de me cegar. Na rua me olhavam como se nunca saíra dali, como se nunca tivesse dobrado a esquina dos Ipês amarelos, como se nunca tivesse cruzado os trilhos. Recostei-me por breve instante, mas não desfiz malas nem mochilas. Não entreguei presentes nem encomendas.
Se nem o cão não abana o rabo é por que não vacilam mais, é por que não há mais nenhuma fagulha da sombra que jazia por vezes sob a copa de um cinamomo ou perambulava ligeiro pelos corredores à noite.
domingo, 21 de dezembro de 2008
Woody Allen ou Almodóvar?
Saí há pouco do cinema. Vi o último do Woody Allen "Vicky, Cristina Barcelona". Está bem; estavam lá Javier Barden, Penelope Cruz, Barcelona, Miró, mas não só por isso pensei ter saído da sessão de um filme de Almodóvar. Mesmo assim, gostei.
Surpresa no sacolão.
Dois garotinhos, irmãos gêmeos, com 3 ou no máximo 4 anos estão no "sacolão" com o pai. Os dois ganham cada qual um saco de salgadinhos Elma Chips. Um deles abre logo o seu e sem rodeios demonstra todo o seu contentamento, dizendo:
-Ôoo vida boa!
Todos riem com a espontaneidade do piá, até a italianinha que não mostra os dentes enquanto houver homem no caixa. O outro gêmeo, conserva o seu saco fechado e mostrando uma certa perplexidade diz ao pai:
- Pai, tem que pagar! - ignorando que o velho remeche na carteira a procura da nota certa.
- Pai, a gente não vai pagar? - e o pai paga, eles saem e o guri segue dizendo:
- Pai, tem que pagar!
Dois gêmeos. Duas personalidades já tão difusas em tenra infãncia.
-Ôoo vida boa!
Todos riem com a espontaneidade do piá, até a italianinha que não mostra os dentes enquanto houver homem no caixa. O outro gêmeo, conserva o seu saco fechado e mostrando uma certa perplexidade diz ao pai:
- Pai, tem que pagar! - ignorando que o velho remeche na carteira a procura da nota certa.
- Pai, a gente não vai pagar? - e o pai paga, eles saem e o guri segue dizendo:
- Pai, tem que pagar!
Dois gêmeos. Duas personalidades já tão difusas em tenra infãncia.
O que fica para trás.
Totó era o nome do personagem principal do filme Cinema Paradiso. O menino italiano, apaixonado por cinema, que largou a vida difícil na Sicilia para se transformar em um laureado cineasta em Roma. O personagem virou um arquétipo de todos os cinéfilos, particularmente daqueles que vislumbravam para si um destino idêntico.
O franzino Totó inicia a jornada pentelhando Alfredo, o responsável pela projeção das fitas exibidas na sala de cinema da pequena Giancaldo. Curioso era descobrir que a sala pertencia à Igreja. O Padre era uma figura formidável, engraçado, ele assistia a todos os filmes ante, sozinho na imensidão do cinema vazio, e cortava todas as cenas eróticas, pecaminosas, mesmo que o pecado fosse um inocente beijo ou levantar de saias.
Ele e Totó protagonizaram uma das cenas mais comoventes do filme e talvez do cinema.
Totó depois de substituir Alfredo, ainda guri, na cabine de projeção, deixa a cidade para prestar o Serviço Militar e retorna adulto. Não encontra mais seu grande amor Stela e tampouco perspectivas na cidade e decide deixá-la motivado por Alfredo, seu grande amigo e confidente. “Vá e não volte!” diz Alfredo, cego e melancólico, interpretado pelo charmoso Philip Noiret. “Esta é uma terra má” – referia-se a Sicilia. "quando se vive aqui, pensamos viver no centro do mundo, mas ao retornar depois de muitos anos, percebe-se que nada mudou". Diante de tal eloquência não resta alternativa.
Na estação, todos os amigos estão junto a Totó que espera o trem para Roma. O padre chega atrasado e encontra ele já embarcado no vagão que se afasta, em slowmotion enquanto o velho religioso em sua batina preta lamenta "Que pecatto!" por não ter se despedido do amigo.
As despedidas são tristes, mas também são uma forma de demonstrar a importância que os que se separam representam um para o outro. Estranhamente, mesmo que haja a expectativa de um reencontro em breve, o ritual tem uma simbologia que foge do efêmero, parece consolidar a intenção de se perpetuar a amizade, o respeito mútuo. De marcar com um selo que as experiências vividas juntas vão ficar na memória e vão preservar os motivos que justificariam o reencontro.
No último fim de semana fui a Alegrete para o casamento de um bom amigo e pensei em aproveitar a ocasião para me despedir de um outro. Com o casamento deu tudo certo, foi uma grande festa, um reencontro com tantos queridos desgarrados, mas não deu certo com a despedida. Não houve o reencontro, talvez, por uma série desafortunada de pequenos desencontros, de números de telefones que não existem mais ou que estão com outras pessoas, a agenda que se perdeu, alguém que não deu o recado ou simplesmente, por uma vontade deliberada de não reencontrar para não se despedir.
A ocasião da despedida talvez seja uma das mais simbólicas representações da humanidade. O adeus está presente desde a festa na empresa para o colega que sai transferido até o funeral que nos leva para sempre um ente-querido. Confesso que fiquei um pouco incomodado, por não ter me despedido, deste amigo em questão, mas deles, dos que não se despedem, não posso falar, pois eu mesmo, que digo preservar as despedidas, por diversas vezes deixei para trás lugares e pessoas no meio da madrugada.
O franzino Totó inicia a jornada pentelhando Alfredo, o responsável pela projeção das fitas exibidas na sala de cinema da pequena Giancaldo. Curioso era descobrir que a sala pertencia à Igreja. O Padre era uma figura formidável, engraçado, ele assistia a todos os filmes ante, sozinho na imensidão do cinema vazio, e cortava todas as cenas eróticas, pecaminosas, mesmo que o pecado fosse um inocente beijo ou levantar de saias.
Ele e Totó protagonizaram uma das cenas mais comoventes do filme e talvez do cinema.
Totó depois de substituir Alfredo, ainda guri, na cabine de projeção, deixa a cidade para prestar o Serviço Militar e retorna adulto. Não encontra mais seu grande amor Stela e tampouco perspectivas na cidade e decide deixá-la motivado por Alfredo, seu grande amigo e confidente. “Vá e não volte!” diz Alfredo, cego e melancólico, interpretado pelo charmoso Philip Noiret. “Esta é uma terra má” – referia-se a Sicilia. "quando se vive aqui, pensamos viver no centro do mundo, mas ao retornar depois de muitos anos, percebe-se que nada mudou". Diante de tal eloquência não resta alternativa.
Na estação, todos os amigos estão junto a Totó que espera o trem para Roma. O padre chega atrasado e encontra ele já embarcado no vagão que se afasta, em slowmotion enquanto o velho religioso em sua batina preta lamenta "Que pecatto!" por não ter se despedido do amigo.
As despedidas são tristes, mas também são uma forma de demonstrar a importância que os que se separam representam um para o outro. Estranhamente, mesmo que haja a expectativa de um reencontro em breve, o ritual tem uma simbologia que foge do efêmero, parece consolidar a intenção de se perpetuar a amizade, o respeito mútuo. De marcar com um selo que as experiências vividas juntas vão ficar na memória e vão preservar os motivos que justificariam o reencontro.
No último fim de semana fui a Alegrete para o casamento de um bom amigo e pensei em aproveitar a ocasião para me despedir de um outro. Com o casamento deu tudo certo, foi uma grande festa, um reencontro com tantos queridos desgarrados, mas não deu certo com a despedida. Não houve o reencontro, talvez, por uma série desafortunada de pequenos desencontros, de números de telefones que não existem mais ou que estão com outras pessoas, a agenda que se perdeu, alguém que não deu o recado ou simplesmente, por uma vontade deliberada de não reencontrar para não se despedir.
A ocasião da despedida talvez seja uma das mais simbólicas representações da humanidade. O adeus está presente desde a festa na empresa para o colega que sai transferido até o funeral que nos leva para sempre um ente-querido. Confesso que fiquei um pouco incomodado, por não ter me despedido, deste amigo em questão, mas deles, dos que não se despedem, não posso falar, pois eu mesmo, que digo preservar as despedidas, por diversas vezes deixei para trás lugares e pessoas no meio da madrugada.
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